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Não permitir tratamento de doença gera dano moral a empregado, decide TRT-4
Demitir portador de doença grave e incurável atenta contra a dignidade da pessoa humana, contrariando o artigo 170, incisos II e III, da Constituição. Afinal, todos têm o direito a uma existência digna, com justiça social. O entendimento levou a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (Rio Grande do Sul) a determinar a reintegração de uma gerente do Banco Santander no interior gaúcho, demitida enquanto estava doente. Ela foi diagnosticada com lúpus, doença provocada por desequilíbrio do sistema imunológico e potencializada por fatores de estresse.
Para o colegiado, o fato de a autora não estar recebendo benefício previdenciário na época da dispensa é irrelevante, já que ela não conseguia se afastar do trabalho nem mesmo para fazer as sessões de quimioterapia. De acordo com os desembargadores, os autos mostram que, embora estivesse trabalhando, ela não poderia ser declarada como ‘‘apta para a dispensa’’ pelo departamento de recursos humanos.
O relator dos recursos, desembargador Marcelo Ferlin D’Ambroso, lembrou no acórdão que o Santander tem tanta responsabilidade quanto o Estado na promoção dos princípios da dignidade humana, dos valores sociais do trabalho e da solidariedade. Logo, não poderia promover a dispensa de trabalhadora doente, o que é contrário ao princípio da função social da propriedade.
‘‘Comprovado o dano, a configuração da ofensa prescinde de prova quanto ao prejuízo causado, bastando restar configurado o desrespeito aos direitos fundamentais tutelados, pois a prática de ato ilícito atenta contra postulados consagrados na Constituição da República’’, afirmou, arbitrando a reparação moral em R$ 50 mil.
O relator esclareceu que, embora não haja prova que o trabalho tenha sido o agente causador do lúpus, ficou evidenciado no processo que o banco não adotou nenhuma medida para amenizar o sofrimento da sua funcionária, sequer lhe dando a chance de se ausentar do trabalho para tratamento médico. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 7 de outubro.
Excesso de estresse
A autora narrou, na inicial da reclamatória, que foi admitida em 2 de agosto de 2000, para trabalhar na agência de Gramado, lá permanecendo até junho de 2006 — quando foi promovida a gerente-geral. Em maio do ano seguinte, foi transferida para a agência de Canela e, em 2009, para a agência de Igrejinha, sempre no cargo de gerente-geral. Teve o contrato rescindido em 21 de junho de 2010, dia em que o Sindicato dos Bancários emitiu a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT). O Instituto Nacional do Seguro Social deferiu o benefício de auxílio-acidente até 31 de agosto daquele ano.
Na ação trabalhista, dentre outras verbas, a bancária pediu a nulidade da rescisão de contrato de trabalho, com a reintegração ao seu último posto, e o pagamento de danos morais. Argumentou que o quadro clínico em que se encontrava na época da rescisão já mostrava que era portadora de lúpus, causado pela rotina estressante de trabalho: excesso de jornada e cobrança de metas impossíveis de serem alcançadas. Citou a emissão do CAT e o consequente recebimento de benefício previdenciário, o que prova nexo de causalidade entre a doença e o trabalho.
O banco apresentou contestação, alegando que a rescisão contratual não é nula, uma vez que não ocorreu durante acidente ou doença do trabalho. É que o exame demissional concluiu que a trabalhadora estava apta para a rescisão. Além disso, a emissão da CAT teria ocorrido após o ato de desligamento. Logo, o ato de demissão é válido, eficaz e legal.
Na fase de instrução, o juízo da 1ª Vara do Trabalho de Taquara determinou perícia médica. E o perito atestou o diagnóstico de lúpus eritematoso sistêmico (LES), transtornos glomerulares em doenças sistêmicas do tecido conjuntivo, transtorno depressivo recorrente e doença renal hipertensiva. No entanto, concluiu pela inexistência de nexo de causalidade entre tais diagnósticos e as condições de trabalho da autora.
Em manifestação à Justiça do Trabalho, o Instituto Nacional do Seguro Social informou que a autora estava em gozo do auxílio-doença.
Sentença improcedente
O juiz do trabalho Eduardo de Camargo, ao julgar o mérito da ação trabalhista, afirmou que a reclamante, quando da dispensa, não estava afastada, recebendo o auxílio-doença. Isto é, seu contrato de trabalho naquele momento não estava suspenso. Destacou que os artigos 476 da Consolidação das Leis do Trabalho e 63 da Lei 8.213/1991 (Lei dos Benefícios Previdenciários) consideram o período de afastamento como de licença. Assim, o empregador tinha o direito potestativo de dispensa, não se podendo falar de arbitrariedade ou ilegalidade.
‘‘O art. 118 da Lei 8.213/91 assegura a estabilidade provisória por doze meses ao empregado que sofreu acidente do trabalho e, por isso, usufruiu do auxílio-doença acidentário. Não faz jus a essa garantia o trabalhador que gozou de auxílio-doença, não tendo sido comprovado nos autos o nexo de causalidade entre a moléstia e a atividade profissional desenvolvida em prol do reclamado’’, justificou na sentença.
Para o julgador, o nexo causal, para efeito de reconhecimento de doença ocupacional equiparada a acidente de trabalho, pode se dar quando verificado que a atividade contribuiu para o agravamento da doença — a chamada concausa. No entanto, a seu ver, no caso presente, não existe vinculação direta das patologias da reclamante, comunicadas por CAT emitida pelo sindicato da categoria, com as atividades profissionais.
Por consequência, o fato de inexistir nexo de concausalidade entre doença e o trabalho desempenhado pela reclamante isenta o empregador do pagamento de indenização por danos morais. Para que houvesse o dever de indenizar — definiu o julgador —, seria necessária a caracterização de todos os requisitos previstos no artigo 186 do Código Civil: o dano, o nexo de causalidade e a culpa pela violação de um direito.
FONTE: CONSULTOR JURÍDICO